sábado, 11 de agosto de 2007


O CORVO E O COMEÇO DE UMA ESTRADA




Onde o Rio Reno faz uma curva.

Num monumento sobre a Floresta, a estátua de Germania

Observa o rochedo vazio da presença da ninfa Loreley.

O Reno não muito largo, mas navegável por navios, desliza

No seu mistério até hoje indecifrável, deixando somente o

Marulhar de suas águas correr para a fenda do Céu de Odin,

Protegendo em suas entranhas o povo de Nibelung.

Eu estava hospedada perto dalí, em Francfurt, e fora pas-

Sear com as amigas alemãs Betty, Traute e Ingrid.

Não me cansava de olhar admirada a estátua de Germania,

Alta, imperiosa, porque essa estátua em um medalhão doura-

Do ornamentava um livro alemão de 5kg, que eu herdara de

Um avô. Nem eu mesma imaginava a emoção de se consta-

Tar que algo de criança existia, era verídico!

Voltamos aos nossos lares pela floresta, passeando no

Automóvel, pela margem do Reno.

Foi então que eu o ví! O corvo!

Chovera naqueles dias e o pássaro negro, sonho dos meus

Sonhos numa terra onde ele não existia, seguia empolei-

Rado num monte de galhos e sarças, levado rio a baixo

Pela forte corrente, resto da tempestade.

Dei um grito: um corvo!

O alemão é discreto nos seus atos e não está acostumado

À gritos – no mesmo instante Ingrid me repreendeu:

Voce assustou a Traute!
...Se fosse na Itália, meu grito teria sido aceito como perfei-

tamente natural, pela surpresa, mas na Alemanha me fez

pedir desculpas à motorista...

Era o primeiro corvo, e ele me indicava uma estrada onde

Outros de sua espécie, me esperavam...

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E como os sonhos de criança podem ser realidades, eu resolvi

Realizar mais um.

Eu sonhava sim, desde que pude dar acordo de mim, com um

Lugar na India, selvagem como as ilhas do Havaí que me fas-

Cinavam, e a India me seduzia, com seus templos, seus

Deuses e suas dançarinas cobertas de jóias e flores. Era tão forte

Essa imaginação que eu me perdia nas aulas do colégio, sonhan-

Do de olhos abertos. Não fosse a minha rápida compreensão de

Tudo que não se tratasse de números, eu teria feito o tempo esco-

Lar com dificuldade.

Não demorou muito para o sonho se transformar em sofrimento.


A minha amiga Ingrid, desde o nosso primeiro encontro no colégio,

Apesar de materialista e atéa, tinha um genio maravilhoso e era a

Única a me aturar com a maluquice... fomos inseparáveis, no seu

Casamento, no seu único filho, até sua morte.

Mortos minha mãe e meu pai, ficando herdeira, não deu outra...

Resolvi partir para a India...

Procurei Lesly, filha de italianos, mas que residia seis meses na

Italia e seis meses no Brasil.

Lesly me hospedou em seu apartamento em Verona, a caminho

Para a India.

Mas que India?

Lesly, guia turística, preparou um programa com passeios por

Nova Delly, Bombaim, tipo turismo.

Não, não, Lesly, não é isso que eu quero...
Então, o que é que voce quer?
Eu não sei...
Olha aqui, vê esse livro de turismo e vê se acha alguma coisa...
Folheei o livro enquanto ela cozinhava (estávamos na cozinha, em

Verona, norte da Italia e pátria dos pais de Lesly).

Folheando o livro, dei com um nome: MADURAI.
E como estávamos na Italia, dei um tremendo grito:

É aqui, Lesly, é aqui que eu quero ir!
Madurai fica no sul da peninsula que é a India – bem no meiozinho –

Entre dois Oceanos

A viagem foi feita através da Suiça, via Sri Lanka - que deu muito

Trabalho à Lesly, pois quase fiquei retida no Aeroporto do Sri Lanka: pois sendo eu brasileira, e o Sri Lanka comunista, naquela

Época não tinha relações diplomáticas com o Brasil.


No dia seguinte, após pedirmos o café da manhã, ao abrir a janela,

Oh! Quem apareceu? Ou melhor, apareceram? Os corvos! Me

Apresentei e convidei-os a tomar café comigo na mesa. Foram muito

Educados e eu lhes apresentei pedaços de bolacha com geléia. Eram

"boa boca", comiam de tudo, só Lesly foi tomar seu café sentada na

cama: - Não sei como voce pode comer com esses bichos em cima

da mesa!

Também ficavam sobre o aquecedor enquanto eu tomava banho de

Chuveiro na banheira. Loucos por novidades, conversavam comigo

O tempo todo: - Oh! Ah!

O Sri Lanka é um país budista e calmo.

Os gatos, os corvos, as baratas, um imenso elefante esperando não sei quem num recuo de uma casa, solto, sem incomodar ninguém,

Os cachorros, são de todo o mundo e todos os alimentam. Sempre

Digo aos bichos: - Querem ser felizes? Reencarnem no Sri Lanka!

Visitei os Viharas (Mosteiros budistas – Budismo Theravada) onde

Fui muito bem recebida, pois o Budismo é de converter: - Ide e

Pregai! – e recebí a lição de que a árvore Bodhi, símbolo da Ilu-

Minação do Buda, nunca deve ficar no chão, mas sim, cercada por

Pequeno muro está sempre no alto. Os monges gentilíssimos, di

Ferentes dos hindus com quem iria me encontrar...



Dalí, num avião da Air India, aterrissamos em Tiruxirapali, no Sul

Da India. O avião encostou numa casinha que era o Aeroporto..

Saltei do avião, sob um vento forte e quente, caminhei sobre uma

Terra preta (que antes tinha descrito para Lesly que era assim) e

Ela na frente, virou-se para trás e perguntou:

- Como é que voce sabia?

:

Lisley e eu levávamos mochilas de nylon, nem malas... mesmo

Assim fomos interrogadas separadamente e eles perguntavam:

Onde estão as pedras do Brasil?
Pedras? Que pedras?
O meu passaporte passou de mão em mão e foi fuçado 16 vezes!

Só pararam quando um deles meteu a mão na minha bolsa e deu com

Um rosário hindú (mala) – aí pediu desculpas e nos liberaram.

Passei 24hs em Tiruxirapali, subí duzentos degraus escavados num templo dentro de um rochedo e quase fomos mortas, porque eu ao

Ver num dos nichos que ladeiam a escadaria, a imagem de um

Lingam (órgão sexual do deus Shiva) da altura de um homem, com

Um pano roxo enrolado na sua base e ladeado pelas duas shaktis

Ida e Pingala (em forma de mulheres em tamanho natural) o mostrei

Para Lisley e ia começar a discorrer sobre o fato quando vi atrás

Dela hindús em atitude ameaçadora... eu disse:

Não olhe para trás... finja que estamos falando outra coisa...
Estávamos no Tamil Nadu, a terrível região desertica da India.

Não é costume os turistas irem lá. Os guias sabem que é perigoso.

Aluguei um carro Ambassador – resto da colonização inglesa, e

Através do deserto, alcancei Madurai.

O Deserto tem formações de pedra, como as que existem no Paraná,

Aqui, no Brasil. É um deserto como as caatingas do nosso Nordeste,

Não é de areia, como o do Saara.

Depois de viajarmos 142km, entramos em Madurai, onde há seis

Meses não chuvia.

O calor estava 53 graus e o vento levantava a poeira das ruas e cal-

Çadas.

Mas foram 142km sem serem vistos cadáveres de cachorros e outros

Animais na beira da estrada...Viva a India!

Era lá, sim... Entramos na jungle de carro, vimos e nos demos com

Muitos macacos, visitamos muitos templos, o de Meenaqueche por

Exemplo, enorme, com Universidade dentro – limpíssimo. Um

Corredor assombrado com deuses enormes esculpidos em pedra –

Que eu separada de Lesly, não tive coragem de entrar sozinha.

Madurai é conhecida como a cidade do Amor, o Semen de Shiva.

Mas eu queria o meu templo, o templo pequeno que eu via com uma

Espécie de praça de terra grande na frente, um pátio cercado por

Muros e de um corredor coberto, de pedra, eu via além do último

Muro do pátio, uma pequena colina marron.

Não tem um templo por aqui assim assim, dedicado ao deus
Shiva? (eu achava que era Shiva)

Tem sim senhora, ele fica a 8km da cidade e eu levo a senhora
Amanhã la.

Levou.

Não tinha a magestade dos outros.

Era pequeno na parte da frente, mas seu corpo atrás se prolongava

Escavado em imensa cadeia de rochedo.

Na frente, ele tinha uma espécie de varanda coberta, sustentado o

Teto por cavalos empinados com deuses pequenos entre as pernas

De baixo. No meio da varanda, estava a entrada. De um lado

Da varanda, macacos pulavam travessos e do outro lado, um ele-

Fante adolecente tirava moedas de nossas cabeças com a tromba.

No Brasil eu havia deixado tres cachorros e 35 gatos. O elefante

Me cheirava sem parar e o guia disse que eu estava com medo –

Que medo? Ele me cheira com força me empurrando com a tromba
E voce acha que eu posso enfrentar um elefante?

Era aquele templo sim... Imundo, não limpo como os outros, cheio

De escarros vermelhos da semente que mascavam, de cocôs de pom-

Bos e morcegos vivendo nas traves do teto.

Vendo a minha intenção de percorrer as outras salas do Templo, os

Indús fizeram uma barreira para eu não me aproximar do altar e eu

Lhes fiz gesto de que ficassem tranquilos.

Naquele dia não pude descer para ver o pátio e tirar minhas dúvidas.

O chão de pedra escaldava e meus pés descalsos não conseguiram

Aguentar.

Voltei no Domingo – o Templo enfeitado, um anão todo fardado me

Mostrava a porta da entrada com cabeças de lança de ferro como pro-

Teção, Desci e constatei o alpendre de pedra, os muros do pátio e a

Pequena colina marrom. Chorei muito e os mendigos deitados no

Chão onde impressos na pedra se viam pegadas humanas – eles

Perguntavam se eu queria que eles riscassem meus pés com giz – eu

Disse que não – num altar secundário ali, enquanto o sacerdote indu

Se distanciou para o fundo, eu arranqeui cabelos meus e escondi numa mesa do altar – o sacerdote voltou com uma bandeja, me poz

Uma comida na boca com gosto de cana e me apresentou ou-

Tra bandeja com cinza em que eu mergulhei os dedos e risquei tres

Listras na testa como os tres reinos de Shiva – ele fez com a cabeça

Que estava bem. Lá, abanando a cabeça quer dizer "sim".

Lesly comprou "santinhos" e descobriu que o templo era consagrado

Ao deus Murunga, um filho de Shiva e Parvati. Murunga é conhecido como o Subramanya ou o Kartikeia, muito cultuado em Bali e em toda Indonesia.

Dalí ainda visitei Madras

E anos depois, quando tomava café da manhã num hotel no Egito,

A mesa da minha excursào dava para uma janela com uma Bandeira.

Alí posou um pássaro grande e com o pescoço um pouco cinza, por

Baixo. Todos perguntavam que pássaro seria.

Eu disse:

- É um corvo.

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